Nikki Haley (gravando): contra ninguém o fiasco da ONU tem sido mais consistente e mais ultrajante do que o seu preconceito contra Israel, o nosso aliado mais próximo. Na sessão da assembleia geral que acaba de ser concluída, a ONU aprovou 20 resoluções contra Israel e apenas seis contra todos os países do mundo juntos.
Ezra Levant: quem aparece no vídeo é Nikki Haley sendo sabatinada. Ela, que passa a ser de agora em diante embaixadora de Donald Trump nas Nações Unidas, assume uma abordagem indubitavelmente pró-Israel, uma abordagem bem diferente daquela do presidente Obama. Mas fora Nikki Haley, como tem atuado Donald Trump quanto a Israel e ao Oriente Médio? Ele cumpriu a promessa de ser pró-Israel, transferindo a embaixada americana de Tel-aviv para Jerusalém, deixando de intimidar os israelenses no tocante à construção de assentamentos? Vamos receber agora no estúdio o nosso amigo Dr. Daniel Pipes para falar sobre isso, ele que acaba de chegar do Middle East Forum. É um prazer tê-lo conosco!
Daniel Pipes: o prazer é todo meu, Ezra.
Levant: Bem-vindo ao nosso humilde estúdio. Eu gosto do que Nikki Haley fez até agora. Ela vive falando sobre este preconceito anti-Israel, mesmo agora que ela está inserida no seio da ONU, de modo que eu não acho que ela está sendo cooptada pelos diplomatas de carreira e os burocratas. Como Trump tem se saído em outros aspectos?
Pipes: Nikki Haley tem sido fantástica. Quanto aos demais aspectos as coisas não estão indo tão bem. Quando se olha para a questão mais importante de todas, o acordo com o Irã, o JCPOA (Plano de Ação Conjunta), que Trump classificou como "o pior acordo da história", se percebe que nada aconteceu em pouco mais de dois meses. Nada mesmo.
Levant: o que poderia ter acontecido? O que ele poderia ter feito? O que ele deveria fazer? O que ele prometeu fazer?
Pipes: Ele nunca disse exatamente o que iria fazer, mas falou muito mal dele (acordo). E o mais impressionante em relação ao acordo com o Irã é que não é um acordo. É uma proposta unilateral dos Estados Unidos. Ninguém além do governo dos EUA o assinou. Nenhum outro governo. Nem o iraniano e nem os outros cinco países. De modo que Trump poderia simplesmente rasgá-lo. Ele poderia alterar a sua implementação. Ele poderia fazer um monte de coisas, mas não fez. Nada aconteceu, pelo menos em publico, até onde nós temos conhecimento.
Levant: À medida que a sua retórica muda, eu percebo que a retórica do Irã está ficando cada vez mais dura no Golfo Pérsico. Trump ou seu secretário de estado se pronunciaram de forma diferente? Eu notei uma mudança na forma de falar com a Coreia do Norte. O secretário de Estado, Rex Tillerson, disse basicamente que a negociação não dará frutos. Eles disseram o mesmo em relação ao Irã?
Pipes: não, mas eles foram mais duros, o que não é tão difícil assim, uma vez que a administração Obama era muito condescendente. De modo que há sim um posicionamento mais duro e eu acho que os iranianos estão sendo um pouco mais cautelosos, mas a principal investida da política era a de se livrar do acordo - e nada mudou.
O sr. mencionou a mudança da embaixada para Jerusalém. Mike Pence acabou de reafirmar que ela será transferida, mas, na realidade nada mudou. O sr. também mencionou os conjuntos habitacionais israelenses na Cisjordânia: nesse caso está parecendo mais continuidade do que mudança. Mais importante ainda nas negociações israelense-palestinas, ao que tudo indica, a esta altura, não há nenhuma mudança real. Além disso, um número considerável de funcionários chave da administração de Obama ainda está desempenhando suas funções no Conselho de Segurança Nacional e no Departamento de Estado com mais poder do que nunca. Assim sendo, de modo geral, fora as Nações Unidas, parece mais continuidade do que mudança.
Isso aponta para um paradigma interessante que eu tenho acompanhado desde o início dos anos 1990: que políticos e diplomatas dos Estados Unidos e, presumivelmente, de outros países, que falam de forma efusiva em relação a Israel, recebem tamanhos agradecimentos e por isso que não precisam fazer mais nada. Na verdade eles podem até fazer coisas que são, na realidade, anátemas. Por outro lado, políticos que não são afetuosos em relação a Israel, não recebem nenhum agradecimento, mesmo quando fazem coisas boas para o país. Assim, por exemplo, Barack Obama, do ponto de vista de Israel, efetuou o melhor envio de armas ao país, mas não teve nenhum reconhecimento por isso, porque era sujo com Israel. Trump, por ele e sua equipe serem amigáveis nas palavras, estão recebendo agradecimentos, muito embora, na realidade, não fizeram nada.
Levant: Bem, se passaram pouquíssimos meses e, claro, a construção do muro e a questão da imigração são promessas fundamentais de Trump. A seu próprio modo, elas beneficiam Israel. Além disso, eles dizem a palavra terrorismo e dizem que é islâmico. A palavra islâmico, islamista ou Islã político foi dita mais nos últimos dois ou três meses pela administração dos EUA do que nos últimos dez anos.
Pipes: Sim, mas, de novo, são palavras e não ações. É falar sobre o Islã radical e o terrorismo. Com certeza é um passo à frente, mas as duas iniciativas para controlar a imigração foram um fiasco.
Levant: Bem, isso está nas mãos dos juízes. Talvez se os decretos fossem elaborados de maneira mais refinada, quero crer que no final acabariam se materializando.
Qual seria então o tempo limite? Quero dizer, o sr. diz que Pence reiterou o plano americano de mudar a embaixada. (Acredito que isso foi dito agora na convenção da AIPAC American Israel Public Affairs Committee.) Quanto tempo ainda vai levar até que se comece a cobrar a promessa? Só se passaram dois, três meses.
Pipes: Ao meu ver, enquanto ele se expressar de forma adequada e no tom certo, ele terá muito tempo. Do ponto de vista pró-Israel, a música certa é o elemento chave. As palavras estão em segundo plano. Se você disser coisas boas sobre Israel e falar sobre a força da relação EUA/Israel, terá créditos de sobra que o levará longe.
Levant: sabe, nós da Rebel Media fomos visitar Israel. Nossa equipe era composta de cinco ou seis pessoas. Eu já estive em Israel, somente eu de toda a equipe. Foi muito elucidativo. Eu achei que não iria aprender muito mais porque eu tinha estado lá - mas uma coisa que eu fiquei sabendo realmente chamou a minha atenção e gostaria que o sr. nos esclarecesse um pouco mais. Nosso guia disse que na história moderna como um todo, no século passado no tocante ao conflito árabe-israelense, em todas as guerras juntas, em todo o terrorismo junto, o total de mortes de ambos os lados, segundo ele, e me corrija se eu estiver errado, foi inferior a cem mil.
Agora, apesar disso ela ainda é uma tragédia enorme. Cada uma delas é uma tragédia, mas compare isso aos últimos seis meses na Síria, ou com o que o ISIS está fazendo no norte do Iraque. Comparado a qualquer outra crise de cem anos, menos de cem mil vítimas, e eu não estou sendo condescendente com a gravidade disso tudo, mas me faz pensar que este não é o maior problema que o mundo enfrenta. Este não é o problema mais espinhoso do mundo. Não é, quero dizer, Donald Trump disse que esta é a barganha para terminar com todas as barganhas para resolver de vez o problema. Não, não é. Na verdade é como se fosse um ardil, desinformação ou um placebo. Basta dirigir o foco em cima de Israel e deixar de lado a Arábia Saudita, Irã, ISIS e todos os outros países. O sr. acha que o fato de Trump ignorar Israel é uma vantagem oculta porque ele não vai ficar obcecado com Israel como Bill Clinton, porque ele não vai tentar forçar Israel a fazer um acordo como os outros presidentes?
Pipes: dois pontos. Primeiro você está totalmente certo quanto aos números. Eu sou coautor de um artigo com o professor Gunnar Heinsohn da Alemanha publicado em 2007, onde descobrimos que o número total de mortes de árabes e israelenses naquela época, desde a Segunda Guerra Mundial, totalizou 51 mil. Além disso, o conflito era o 49º na lista de mortes em guerras internacionais. De modo que sim, são menos mortes do que nos outros 48 conflitos.
Mas eu acho que um acordo no conflito árabe-israelense seria o acordo dos acordos no sentido de que é o problema internacional mais complexo e espinhoso. Há tantas partes envolvidas, incluindo as grandes potências, as potências regionais, os Estados Islâmicos, a comunidade judaica e as outras comunidades religiosas. É a cereja do bolo para conquistar o Prêmio Nobel da Paz. Nada se compara a isso, nada é tão complexo e tão duradouro.
Quanto a Trump não se fixar em cima dele, eu não tenho tanta certeza que ele não vai tentar, porque sendo o autor do The Art of the Deal, ele disse que quer isso, que ele quer intermediar este acordo. Ele tem outras coisas em cima da mesa, como você lembrou - imigração, o muro, a reforma da saúde que não deu certo, tributação, educação e assim por diante. Mas eu acho que resolver esta questão é muito sedutor e eu não me surpreenderia se ele se voltasse para isso em algum momento.
Eu também não me surpreenderia se ele se voltasse contra Israel vendo-o como a parte recalcitrante, visto que é isso que muitas vezes acontece. Veja por exemplo Jimmy Carter e Barack Obama: eles se empenham e saem frustrados porque os israelenses não cederam mais, porque há uma crença persistente segundo a qual só faltava os israelenses cederem um pouco mais, que os palestinos iriam acabar cedendo e parar de ser rejeicionistas e tudo daria certo. De modo que estou apreensivo.
Levant: A ultima pergunta. Há críticas negativas em relação a Ivanka Trump e Jared Kushner, filha e genro de Trump, porque eles têm um relacionamento não usual com o presidente. Eles têm credenciais de acesso e livre movimentação. Eles participam de reuniões. Todos nós sabemos que Kushner e Ivanka faziam parte do império empresarial de Donald Trump e são conselheiros de confiança. Não me surpreenderia se ele quisesse que seus conselheiros de confiança participassem. Não é como a Chelsea Clinton, simples apêndice junto com mãe e o pai, quando ela era apenas um membro da família e não uma conselheira profundamente envolvida.
Kushner é um judeu ortodoxo. Ivanka se converteu. Eles parecem se identificar nesse quesito. Eles têm laços com Israel. O sr. acredita que eles sejam conselheiros de peso em relação a Israel e, se esse for o caso, como classificá-los na questão do espectro político israelense? Eles são de direita? De esquerda? São do tipo do movimento pacifista Paz Agora? Ou são do tipo Likud?
Pipes: Permita-me alongar a sua pergunta para que eu possa incluir David Friedman, advogado de Trump, especializado em falências, que acaba de ser nomeado embaixador dos EUA em Israel e Jason Greenblatt, advogado especializado em bens imobiliários de Manhattan que servirá como representante especial do presidente para negociações internacionais. De modo que se trata de quatro pessoas sem nenhum histórico de envolvimento em negociações israelenses-palestinas ou outras negociações do gênero, são amadores, trazendo o frescor dos amadores juntamente com a inexperiência.
Eu não conheço seus pontos de vista. O único que realmente conhecemos é Friedman, que tem um histórico de escrever sobre o conflito e se encontra ao lado do Likud no espectro político, mas em relação aos outros, não sabemos. Greenblatt, pelo que ouvimos sobre suas negociações em Jerusalém e em Ramala, parece que se encaixa no velho paradigma de "pressionar Israel e aplacar os palestinos". E a filha e o genro? Eu não sei quais são as opiniões deles.
No geral, eu me preocupo com essa falta de experiência. Há um capítulo na história americana que remonta à Primeira Guerra Mundial, de presidentes nomeando pessoas que não têm conhecimento de um determinado assunto com a ideia deles serem imparciais e que trarão novas formas de encarar o problema. Nunca funcionou. Sempre foi uma viagem por mares nunca dantes navegados.
Eu preferiria contar com pessoas que estivessem mais familiarizadas com isso. Você sabe como é, se você tivesse que se submeter a uma cirurgia cardíaca, você iria querer alguém que nunca fez nenhuma cirurgia ou preferiria alguém que tivesse praticado por um tempo? Eu me preocupo com 'freelanceres' amadores. Há muita gente experiente nessa área. É uma matéria muito complexa. Eu me preocupo com pessoas vagando, sendo de repente consideradas especialistas.
Levant: bem, vamos ficar em contato nos próximos meses, ainda é cedo, e o único sinal concreto que eu vejo é Nikki Haley. O resto é uma possibilidade ou uma perspectiva ou um processo, mas eu acho que provavelmente saberemos até o final do ano.
Pipes: sim, a ONU é ótima, é com o resto que eu me preocupo.
Levant: Dr. Daniel Pipes do Middle East Forum, é um prazer tê-lo aqui no estúdio.