Publicado em duas partes em italiano:
- Primeira parte: "L'inverno demografico rende l'Europa un pezzo d'Africa," La Nuova Bussola Quotidiana, 12 de outubro de 2022
- Segunda parte: "'I politici Ue sono complici di chi ci vuole islamizzare'," NicolaPorro.it, 17 de outubro de 2022
Lorenza Formicola: cerca de 5,3 milhões de refugiados ucranianos se encaminharam para a União Europeia desde 24 de fevereiro, apresentando pouquíssimos problemas. Em contrapartida, a Europa entrou em crise com a chegada de pouco mais de um milhão de sírios, iraquianos e demais não europeus entre 2015 e 2016. Qual a sua apreciação diante deste contraste.
Adam Smith (ca.1723 - 1790). |
LF: antes do ataque russo, a vinda dos ucranianos, cuja renda per capita é a mais baixa da Europa, não seria bem-vinda, então, de uma hora para a outra, eles foram recebidos de braços abertos. Esse precedente aponta para futuras crises legitimativas em relação aos fluxos migratórios dadas as circunstâncias que seriam consideradas ilegais?
DP: não, a crise ucraniana é uma grande exceção pelo fato dos ucranianos serem europeus. A esmagadora maioria dos migrantes em potencial que visam a Europa vem de fora da Europa e, portanto, não será calorosamente acolhida a exemplo dos ucranianos. Além disso, a maioria desses não europeus busca acima de tudo melhorar sua condição econômica, o que limita a simpatia por eles.
LF: o racismo explica a diferença na calorosa receptividade dos ucranianos comparada à fria dos não europeus?
DP: todos os seres humanos têm preferência por aqueles que agem e que são parecidos com eles próprios, mas isso tem pouco peso na explicação da receptividade contrastante dos ucranianos e dos não europeus. Eu listei e expliquei essas diferenças em um recente artigo sobre os refugiados ucranianos. Em suma:
- Refugiados contra migrantes econômicos
- Relutância x avidez
- Proximidade x distância
- Solidariedade x discórdia
- Invasão x problemas domésticos
- Interesse x contra indiferença
- Aptidões significativas x desemprego
- Trabalho x dependência do bem-estar social
- Boa prática da cidadania x criminalidade
- Moderação x islamismo
- Semelhança x diferença cultural
- Assimilação x separatismo
- Contingente limitado x ilimitado
LF: o senhor elaborou a ideia de zonas culturais onde as pessoas deveriam buscar refúgio, assim, a América Latina para os latino-americanos. Como a crise ucraniana se aplica a este conceito?
DP: ela confirma a naturalidade dos europeus buscarem e receberem refúgio na Europa. Não é a mesma coisa quando somalis e curdos exigem a entrada.
LF: dado que a população autóctone da Europa está encolhendo, ao mesmo tempo em que a previsão da África é triplicar até 2100, então a África é o futuro da Europa?
DP: pode até ser, a menos que haja alguma mudança célere. Vejamos algumas estatísticas: em 1885 estimava-se que a população da Europa (menos a Rússia e a Trácia turca) contasse com 240 milhões de habitantes, enquanto a África com cerca de 100 milhões. Hoje, os contingentes equivalem a cerca de 600 milhões e 1,25 bilhão respectivamente. Os demógrafos preveem que em 2050 as populações equivalerão a 600 milhões e 2,5 bilhões, respectivamente. De modo que, ao longo de 165 anos, a população da África terá crescido dez vezes mais rápido que a da Europa. Em 2100, estima-se que a grandeza dos números atinja cerca de 500 milhões e 4 bilhões.
Eu tenho conhecimento de apenas um livro sobre o tema, The Scramble for Europe by Stephen Smith¹. Curiosamente, Smith vê nessa imigração simplesmente um problema mais para a África do que para a Europa (com base no fato de que os talentosos estão partindo). Eu, contudo, vejo que o problema é inundar a Europa com povos de uma cultura extremamente diferente. Imagino que pouquíssimos europeus aceitem de bom grado essas mudanças. Salvo se uma barreira eficiente contendo a imigração desenfreada seja erguida em breve, a Europa poderá virar uma extensão da África.
LF: a Itália é o país europeu mais atingido pela imigração ilegal. Embora o Lega (partido de centro-direita da Itália) tenha conseguido reduzir o problema em 97% no período em que estava à frente no Ministério do Interior, a repatriação se esquivou até dela. Por que isso?
DP: conforme Matteo Salvini mostrou de forma dramática, é relativamente simples impedir a entrada de imigrantes ilegais criando patrulhas, rejeitando navios "táxi" lotados de imigrantes ilegais e enviando sinais negativos aos ilegais em potencial. A repatriação são outros quinhentos, envolve famílias, empregos e o sistema judicial, tornando-a muito mais cara, complexa e malsucedida.
LF: o ISIS e outros grupos terroristas islamistas procuram explorar a imigração ilegal como meio de se infiltrar na Europa. Qual o tamanho deste problema?
DP: jihadistas disfarçados de migrantes comuns se envolveram com sucesso em violentos incidentes na Europa e na América do Norte. Enquanto os migrantes não forem devidamente checados e tiverem livre acesso aos países ocidentais, é de se esperar que esse padrão continue.
LF: ecoando o que aconteceu no final de 2021, quando a Polônia se viu invadida por migrantes vindos da Bielorrússia, os bengaleses que chegam em voos fretados representam os migrantes ilegais mais comuns em solo italiano. Mas, ao passo que Varsóvia botou a boca no trombone, indignada, Roma nada fez. Por que o senhor acha que isso acontece?
DP: primeiro, o atual governo polonês se preocupa com os imigrantes ilegais de um jeito que seu homólogo italiano não se preocupa. Segundo, o fato do governo da Bielorrússia ter convidado esses migrantes com o intuito de explorá-los simplesmente como massa de manobra contra a Polônia tornou a questão altamente emotiva e um desafio para o estado polonês.
LF: qual a sua leitura da recente decisão da Comissão da União Europeia de promover a hijab (véu islâmico) como símbolo de diversidade e liberdade?
DP: isso se enquadra na atitude, a esta altura, tradicional do que chamo de 6Ps, ou seja, políticos, imprensa, polícia, promotores, professores e sacerdotes. Eles veem a cultura da Europa moralmente inferior às de outras regiões devido ao trio de racismo, imperialismo e fascismo da Europa (como se esses horrores se limitassem à Europa). Eles estão ávidos a importar costumes que reduzam a civilização europeia.
LF: os líderes europeus são apedeutas ou cúmplices da islamização do Ocidente?
DP: cúmplices: os 6Ps que acolhem calorosamente a islamização. Eles denigrem o cristianismo e o judaísmo, mas recebem de braços abertos o islamismo, agora a religião das honoráveis vítimas.
LF: Bat Ye'or acusa as instituições europeias de promoverem a islamização por elas incentivarem a imigração de países muçulmanos e, na sequência, demandarem o diálogo cultural. O senhor concorda com ela?
DP: sim, concordo. Ela vê esse processo sendo mais organizado e mais intencional do que eu, mas não faz muita diferença.
LF: há governos ocidentais aliados do islamismo radical?
DP: de forma limitada, em certos momentos e em alguns lugares, sim, por exemplo, na Líbia e na Turquia. Mas não mais do que isso.
LF: na França, a questão do véu nas escolas está de volta, mais forte do que nunca. Por que é tão importante as meninas usarem a hijab?
DP: a hijab mostra que as meninas são muçulmanas, isolando-as dos demais estudantes e asseverando a superioridade delas por meio do recato.
LF: por que tantos políticos e intelectuais insistem que a hijab é só um inocente símbolo cultural, análogo ao véu da freira católica?
DP: reforçando, porque ela esvazia os tradicionais costumes e convenções da Europa.
LF: dado o crescimento do antissemitismo alimentado pelos muçulmanos, os judeus têm algum futuro na Europa?
DP: eu acho que não. No blog "Jewish Life in an Increasingly Muslim Europe², que criei em 2004 e que venho atualizando com frequência," eu registo uma pequena fração das dificuldades que os judeus estão sofrendo na Europa, do fanatismo aos assassinatos. Estes ocorrem em larga escala.
Curiosamente, nos últimos anos, os europeus não judeus começaram a ter inveja dos judeus porque eles têm onde se refugiar. No romance Soumission de Michel Houellebecq, a namorada judia de um cristão diz que ela está fugindo do governo islamista na França, mudando para Israel. Ele responde com tristeza: "não há Israel para mim".
LF: o senhor define "partidos civilizacionistas" como partidos europeus com um denominador comum para preservar os costumes ocidentais, especialmente da ameaça islamista. Eles são a única barreira contra a transformação da civilização?
DP: não, não são. Como pode ser visto de forma mais marcante na Dinamarca, partidos de esquerda como os sociais-democratas poderão incorporar a causa para limitar a imigração. O fenômeno existe também em outros países, mas somente na Dinamarca existe um partido à frente de uma coligação governamental.
¹ Corrida pela Europa de Stephen Smith.
² A vida judaica numa Europa cada vez mais muçulmana.
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