Para visualizar duas respostas a mais referentes ao artigo Kuperwasser, de Efraim Inbar e Martin Sherman, clique aqui.
Eu aplaudo o Brig. Gen. (res.) Yossi Kuperwasser por sua sutil e tarimbada análise. Dito isto, acredito que o seu plano torna o Hamas potencialmente mais, não menos perigoso para Israel.
Ele defende a tese de que Israel deveria acabar com a ameaça do Hamas "desarmando-o, proibindo-o de se rearmar e demonstrar de forma inequívoca que ameaçar Israel é contra os seus interesses". Isto deixará o Hamas "enfraquecido e dissuadido em relação a Israel, mas forte o suficiente para governar Gaza". Se o Governo de Israel implementasse o plano Kuperwasser, o Hamas não poderia mais atormentar os israelenses em cidades vizinhas como Sderot com foguetes, nem incendiar os seus campos agrícolas com papagaios, balões e preservativos bélicos, tampouco lançar foguetes para interromper um desfile em Jerusalém. Tal providência obviamente aplacaria uma população israelense que está sitiada, mas que teme voltar a Gaza após a retirada unilateral de 2005.
Eu respondo: parar com os papagaios, foguetes e mísseis é obviamente um ganho para Israel. Mas um Hamas desprovido de projéteis aéreos mas que ainda controla Gaza dificilmente viraria algo parecido com a islamista Autoridade Nacional Palestina. Isso daria ao Hamas uma grande oportunidade. Ao longo dos seus quase trinta anos de existência, o governo israelense permitiu que a ANP agredisse o país primordialmente de duas formas: através da violência e da deslegitimação. Não importa o quão execrável seja a atuação da ANP nestas duas arenas, o sistema de segurança de Israel a protege e o primeiro-ministro a financia.
Violência: supondo que o antecedente da ANP se mantenha, o Hamas pode livremente incitar, financiar e armar uma série de ataques de baixa intensidade contra os israelenses, incluindo apedrejamentos, esfaqueamentos, linchamentos, atropelamentos, tiroteios, atentados à bomba, incêndios criminosos e intifadas em grande escala. Túneis e drones suicidas também está de bom tamanho. Em suma é ilusão desarmar o Hamas A violência vai continuar e ainda poderá até piorar.
Deslegitimação: tendo em vista o que a ANP diz sobre o seu "parceiro para a paz", o Hamas pode fazer o que bem entender com total liberdade para vociferar calúnias ao seu bel-prazer: que os judeus descendem de porcos e macacos, que o sionismo representa um movimento imperialista de supremacistas brancos que subjugam um povo autóctone, que Israel oprime, explora e massacra uma população vítima, semelhante a da de Cristo. Além disso, eles podem retratar Benjamim Netanyahu como o novo Hitler, Gaza como campo de concentração e como se os palestinos tivessem vivenciado cinquenta holocaustos.
Eu bem que poderia parar por aqui, tendo defendido as limitadas vantagens do plano Kuperwasser, ele resolve um problema, mas deixa outros dois intactos. Só que a sua implementação poderá tornar o Hamas ainda mais perigoso para Israel. Meu raciocínio:
Embora o antissionismo palestino exista há mais de um século (1920: "a Palestina é a nossa terra e os judeus são os nossos cães"), ele decolou nos anos de 1990, quando a esquerda se voltou contra Israel. Os Acordos de Oslo de 1993, e ainda por cima assinados no jardim da Casa Branca, criaram a ANP, que assim convenceu os poderosos globais de ela tinha aceitado o Estado Judeu, tornando-a a queridinha da política mundial. É claro que a ANP não tinha feito nada disso, só que com isso podia espalhar a mensagem antissionista resumida acima de forma muito mais eficiente do que anteriormente.
A Conferência das Nações Unidas em Durban de 2001, contra o "Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância" simbolizou que esta versão palestina alcançasse uma proeminência sem precedentes e tem crescido desde então. Sendo a favorita causa revolucionária do planeta, os palestinos têm condições de conclamar uma legião de simpatizantes e de recursos de uma rede sui generis de apoio que inclui ditadores, extrema-esquerda, extrema-direita, Nações Unidas, outras organizações internacionais e agrupamentos de islamistas, jornalistas, ativistas, educadores , artistas, padres e bons-samaritanos dos mais variados espectros.
Uma cena da conferência da ONU em Durban, em 2001, contra o "Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância". |
Recentemente o antissionismo atingiu níveis até agora inimagináveis, incluindo a presidência do Chile, o chefe do governo da Escócia, o líder da oposição no Reino Unido e a Câmara dos Representantes dos EUA. As tendências de hoje sugerem que o Palácio do Eliseu, o número 10 da Downing Street e a Casa Branca estarão ao fim e ao cabo ao seu alcance. Isto representa um perigo muito maior para Israel do que ataques cinéticos.
Em outras palavras, embora a violência palestina não represente uma ameaça existencial para Israel, a deslegitimação palestina sim. Neste caso, palavras são mais perigosas do que explosivos. (O oposto vale para o Hisbolá e para o Irã.)
Até agora, e ao contrário da ANP, o Hamas continua sendo largamente rejeitado como organização terrorista, e em grande parte por conta dos papagaios, foguetes e mísseis. Se o Hamas não tiver mais condições de lançar projéteis, seus líderes poderão eventualmente imitar a trajetória da ANP e assinar, embora tardiamente os Acordos de Oslo (quem sabe no jardim da Casa Branca?). Assim acabará automaticamente a designação terrorista e também o transformará num queridinho internacional. E de quebra tal cenário irá adicionar uma mensagem islamista de deslegitimação à mensagem nacionalista da ANP, acelerando e aumentando enormemente o alcance do antissionismo palestino.
Os israelenses, habituados a uma vida inteira de insultos, tendem a não dar bola para a deslegitimação como se já fizesse parte do dia a dia. A vituperação virou um chiado de fundo. Os palestinos mal figuram na política israelense. O estrategista israelense Efraim Inbar rejeita-os pitorescamente como um "incômodo estratégico".
A deslegitimação palestina ameaça Israel tanto quanto as armas nucleares do Irã.
Como alguém de fora, acredito que os israelenses subestimam o crescente impacto do veneno palestino. Sim, é verdade que produtos israelenses, armamentos, alta tecnologia, suprimentos médicos, produção agrícola, tecnologia hídrica, encontraram um mercado global. Concordo que suas forças armadas não têm rival na região. Mas toda esta robustez não libertou os israelenses da questão pendente de obter a aceitação palestina. Até então a deslegitimação palestina ameaça Israel tanto quanto as armas nucleares do Irã.
De modo que, o plano Kuperwasser aumenta potencialmente o perigo que o Hamas representa para Israel, trocando um inimigo mais violento mas menos influente por um inimigo menos violento porém mais influente. Um Hamas sem projéteis e que continua governando Gaza é uma cura pior do que a doença.
Daniel Pipes (DanielPipes.org, @DanielPipes) é o presidente do Middle East Forum. © 2023 por Daniel Pipes. Todos os direitos reservados.
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