Niram Ferretti entrevista Daniel Pipes.
L'Informale: como Israel deveria conduzir a guerra contra o Hamas?
Daniel Pipes: eu torço que o governo de Israel dirija o seu foco em duas questões principais: a destruição do poder do Hamas e o estabelecimento de um novo regime, decente, de habitantes de Gaza que governem Gaza sob a supervisão israelense. Sendo o mais sucinto possível: ganhe a guerra, ganhe a paz. Fora isto, o resto: política interna, reféns, marinha mercante internacional, importam menos.
L'Informale: libertar os reféns e derrubar o Hamas ao que tudo indica, são objetivos mutuamente incompatíveis. São mesmo?
Daniel Pipes: sim, totalmente incompatíveis. Esta contradição aponta para o sentimentalismo da política israelense, a manteiga derretida debaixo da casca grossa. Os inimigos de Israel sabem muito bem disto, consequentemente, visam capturar os seus cidadãos para negociá-los como moeda de troca. Jonathan Pollard foi longe demais quando defendeu a "prisão para silenciar certos familiares dos sequestrados" caso as exigências deles interferissem na condução da guerra, mas eu entendo a frustração dele. Eu alimento a esperança de que o governo israelense irá propor a derrota do Hamas como sendo o caminho mais apropriado para resgatar os sequestrados.
L'Informale: um recente relatório assevera que após 114 dias de guerra, 80% dos túneis do Hamas ainda permanecem intactos. Isto quer dizer que as IDF necessitam de muito tempo para destruir todos eles. O que isso significa?
Daniel Pipes: observe o contraste entre 1967 e 2023/2024. No primeiro caso, uma rápida vitória israelense no campo de batalha, significou uma retirada egípcia e o total controle sobre Gaza em questão de horas, já no segundo, cada metro é uma batalha, o que requer meses. Os próprios israelenses são os únicos responsáveis por tudo isso, por terem saído de Gaza em 2005 e depois terem permitido que o Hamas se entrincheirasse dessa maneira. A longevidade do conflito causa danos ao poder de deterrência de Israel e ainda por cima corrobora as críticas ao país. O único consolo do ponto de vista de Israel é que o 7 de outubro e os seus desdobramentos acordaram o país para os seus malogrados órgãos de segurança, aumentando as chances de consertá-los.
O Hamas depende única e exclusivamente dos túneis. |
L'Informale: o senhor assinalou ao L'Informale em novembro de 2023 que o mais provável desfecho da guerra de Israel contra o Hamas será o "meio fracasso." O senhor continua resoluto nesta opinião?
Daniel Pipes: continuo sim. A guerra inspirou interpretações extremamente diferentes; em particular a visão otimista de Shay Shabtai. "Meio fracasso," no entanto, me parece até um resultado positivo se levarmos em conta a situação como um todo, incluindo o Hisbolá, os Houthis, a Turquia, o Irã, a esquerda global, e por aí vai. As repercussões deste conflito atingiram patamares muito além da minha imaginação, indo da presidência da Universidade de Harvard ao preço das commodities.
L'Informale: Caroline Glick escreve que "por uma geração, o Santo Graal do Estado Maior de Israel, tem sido o de rejeitar o conceito de vitória em si." Até que ponto ela está certa?
Daniel Pipes: a Caroline sabe muito bem como fazer uso das palavras. Este argumento se encaixa no centro do meu próximo livro, "Israel Victory: How Zionists Win Acceptance and Palestinians Get Liberated," mas irei usar palavras mais amenas. Evitar a vitória não é o Santo Graal do Estado Maior, e sim uma postura defensiva aprendida. Ela pode ser desaprendida.
L'Informale: ela, Efraim Karsh, Mordechai Kedar e Martin Sherman concordam que a solução de dois estados é perigosa e está morta. O senhor concorda com eles?
Daniel Pipes: de jeito nenhum. Eu vejo que é praticamente inevitável um estado palestino no longo prazo. Portanto, eles estão travando uma guerra de retaguarda perdida. Em vez de resistir à solução de dois estados, eu os convido a se juntarem a mim e assegurar que haverá um estado palestino, somente quando os palestinos tiverem, lenta e consistentemente, aceito o estado judeu de Israel, em outras palavras, depois deles terem convencido os israelenses da sua derrota. É claro, isto após várias gerações. Vamos deixar isso em banho-maria por enquanto.
L'Informale: se Israel não destruir o Hamas, o Hamas declarará vitória, se apresentará como líder antissionista, o que encorajará tanto o Hisbolá como o Irã, o que levará à outra guerra. O senhor concorda?
Daniel Pipes: sim, quanto à extensão da plausibilidade do Hamas declarar vitória, ela aumentará a autoconfiança islamista sendo um agouro de mais apuros para Israel. Vale ressaltar que o Hamas já declarou vitória: o Wall Street Journal informou que Yahya Sinwar, o arquiteto do massacre do 7 de outubro "ressaltou aos mediadores que o Hamas no fundo no fundo venceu a guerra." Isso não deveria pegar ninguém de calça curta, visto que é de praxe os árabes agirem dessa maneira, seja lá qual for desfecho.
O laço Estados Unidos/Israel é a relação familiar da política internacional, Benjamin Netanyahu e Mitt Romney em janeiro de 2011. |
L'Informale: a Administração Biden admoestou Israel quanto à morte de civis, exigiu que o país forneça ajuda e procura limitar suas ações no Líbano. Chegou a hora de Israel depender menos dos Estados Unidos?
Daniel Pipes: é claro, os israelense adorariam se desvencilhar da intimidação americana. Mas o laço Estados Unidos/Israel é a relação familiar da política internacional, e assim permanecerá. Os americanos interferem na política israelense, os israelenses interferem na dos Estados Unidos Esta duradoura realidade tem seus altos e baixos para ambos os lados. Eles precisam aceitá-la, trabalhar com ela, tirar o melhor partido dela.
L'Informale: qual a importância da decisão do Tribunal Internacional de Justiça de que Israel deve "tomar todas as medidas de que dispõe no sentido de evitar que a perpetração de todos os atos" como causar sérios danos corporais ou mentais ou a matança de palestinos?
Daniel Pipes: este julgamento é um round no vasto confronto entre as forças pró e contra Israel, cada uma lutando para conquistar a opinião pública para o seu lado. Mas eu considero exagerada a importância dada a esta batalha. Ao redor o mundo, a maioria as pessoas que se interessam por política internacional já tomaram partido quanto ao seu posicionamento em relação a Israel e aos palestinos, de modo que o número de indecisos diminui a cada dia que passa. Portanto, eu não acredito que uma decisão como a do Tribunal Internacional de Justiça ou a votação do Senado dos Estados Unidos de 100 a 0 em solidariedade a favor de Israel, tenha tanta importância. "O campo de batalha é mais importante do que opiniões sobre ele"
Adendo de : 31 de janeiro de 2024: ao fim e a cabo, a minha sentença contradiz exatamente a forma de ver as coisas de Mohammed al-Bukhaiti, uma figura do alto escalão dos Houthis que diz: "a vitória na batalha da conscientização é mais importante do que a vitória militar."
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