NOTA DO EDITOR: Nosso diretor executivo, Elwood McQuaid, conversou recentemente com Daniel Pipes, fundador e diretor do Middle East Forum e um dos mais respeitados especialistas sobre o Islã e as questões a ele relacionadas. Temos o privilégio de publicar fragmentos revisados da entrevista.
Elwood McQuaid
EMQ: Dr. Pipes, estamos presenciando uma grande mudança na Europa. Estou me referindo à invasão do Islã e às demandas muçulmanas que estão criando uma Europa islâmica. Justifica-se essa preocupação?
DP: Acredito que sim. Há três componentes.
O primeiro é o demográfico. Os europeus nativos não estão tendo filhos gerando escassez de um terço na população. É necessário 2,1 filhos por mulher [para manter a população] e elas estão tendo cerca de 1,4. Assim sendo, necessitam de imigrantes e esses imigrantes estão vindo de países muçulmanos como a Argélia e a Turquia. Além disso, os países muçulmanos possuem um grande número de jovens.
O segundo componente é o religioso. Pode-se observar praticamente o colapso do cristianismo na Europa e a falta de orientação para um propósito em termos de religião e espiritualidade – que os muçulmanos têm, claro, em abundancia.
E o terceiro é a dimensão cultural. Os europeus se tornaram politicamente corretos, multiculturais, chame como quiser. Os muçulmanos vêm com uma clara sensação de superioridade cultural.
Junte os três e verá a possível transformação de um continente. Ainda não aconteceu. Pode ser evitado. Contudo se a tendência continuar, provavelmente ocorrerá.
EMQ: Parece que os Estados Unidos e a Europa estão resignados em aceitar que o Irã desenvolva armas nucleares. Devemos nos preocupar com isso? E o que deve ser feito a respeito?
DP: Se o Irã tiver a bomba atômica, toda a dinâmica será modificada – não apenas no Oriente Médio, mas no mundo inteiro. Se a administração Obama pretende fazer alguma coisa, ela não irá anunciá-la. Sendo assim, não sabemos. Mas não estou otimista. Mas também não concluiria hoje que os iranianos terão a bomba. Ainda há pressão que possa ser exercida.
EMQ: É possível alcançar alguma coisa com as sanções?
DP: Não acredito. Não acho que sanções terão algum valor, servirão apenas para inglês ver. Não acredito que acordos tenham algum valor. Não acredito que ameaças tenham algum valor. Tudo se resume na aceitação ou na destruição do programa nuclear iraniano.
EMQ: Qual deveria ser a percepção dos israelenses a respeito?
DP: Acredito que seria realista para os israelenses atacarem e causarem danos significativos. Agora, o que significa sucesso, eu não estou bem certo. Há muitas, muitas perguntas. Se eu fosse o [Primeiro Ministro de Israel Benjamin] Netanyahu, eu perguntaria ao [Presidente dos Estados Unidos Barack] Obama, "Por que o senhor não destrói as bombas atômicas iranianas? Senão nós o faremos e, nós não o faremos tentando atravessar com os nossos aviões a Turquia e a Síria ou a Jordânia ou a Arábia Saudita. Nós o faremos com armas nucleares táticas, baseadas em nossos submarinos. O senhor não quer isso, nós não queremos isso; mas com certeza essa é a forma que podemos fazê-lo. Faça do seu jeito para não chegarmos a esse ponto". Essa seria uma maneira de pressionar. Há muitos detalhes que eu desconheço. Mas esse seria o meu tipo de abordagem se eu fosse os israelenses.
EMQ: O senhor acredita que os líderes no Ocidente estão realmente prestando atenção no [líder iraniano Mahmoud] Ahmadinejad e acreditando nele?
DP: Parece que há uma crescente disposição em aceitar as armas atômicas iranianas e de inserir o governo iraniano no sistema internacional. Contudo, se também há um empenho em enfraquecer ou mesmo eliminar essa ideia, é difícil de se saber.
EMQ: Sobre a questão da paz entre israelenses e palestinos, aparentemente não está acontecendo nada. Por que isso é verdade, e será que diminuiu a determinação dos palestinos em destruir Israel?
DP: Não, ela não diminuiu. Está lá, virulenta como sempre. Em cerca de 90 anos de respostas dos palestinos no que tange a Palestina, criada pelos britânicos logo após a Primeira Guerra Mundial, aproximadamente quatro quintos dos palestinos se recusaram a ter qualquer coisa a ver com o Ishuv [comunidade judaica em Israel anterior à soberania] ou Israel e um quinto dizia, "Ok, podemos nos adaptar". Esse número extraordinariamente permaneceu igual em quase um século.
Por que nada mudou? Essa é uma pergunta muito interessante. A administração Obama tomou posse e tinha duas facções dentro dela. Uma dizia, "Nós podemos obter concessões dos israelenses se trabalharmos com eles". A outra dizia, "Podemos conseguir o que quisermos de Israel se criarmos propositalmente uma polêmica". A segunda facção prevaleceu inicialmente. E começaram a polêmica focando nos assim chamados assentamentos. (Eu não gosto desse termo, mas vou usá-lo para ser breve). [A Secretária de Estado dos Estados Unidos] Hillary Clinton declarou, "Sem qualquer tipo de crescimento, de forma nenhuma, ponto". [Nem mesmo em Jerusalém].
Como efeito tivemos duas inadvertidas consequências que os gênios na Casa Branca não tinham imaginado. Primeira, fez com que os israelenses apoiassem Netanyahu visto que essa política era totalmente inaceitável para eles. Netanyahu ficou fortalecido, não enfraquecido. Segundo, os palestinos que estavam negociando com os israelenses disseram, "Chega! Se os americanos disseram que vocês não podem expandir os assentamentos, então nós diremos que vocês não podem expandí-los". Assim a administração Obama endureceu a posição em ambos os lados ficando sem negociações em andamento – o que para mim está ótimo. Mas do ponto de vista deles, é um desastre.
EMQ: O Islã é elogiado em termos extremamente positivos como uma religião dedicada à paz, ao amor e à coexistência com outras religiões. Se fosse verdade, então porque os muçulmanos são os principais perseguidores dos cristãos no mundo inteiro?
DP: O Islã é uma religião de 1.400 anos e possui formas muito diferentes. Houve épocas e regiões em que o Islã era tolerante, pelo menos em comparação a outras civilizações no mesmo período. Hoje, evidentemente, esse não é o caso. Realmente, falando como historiador do Islã, eu diria que nunca houve um momento pior na história muçulmana. Há muitos pontos de vista e um deles é o de que a sua intolerância não é apenas voltada contra os cristãos. Os cristãos são um exemplo proeminente.
Os próprios muçulmanos liberais e de mente aberta, são perseguidos. As primeiras vítimas do Islã radical são os muçulmanos. Um exemplo é o caso de Darfur. Esse evento é incontestavelmente a pior crise humanitária do mundo no momento. E trata-se de muçulmanos contra muçulmanos. O sofrimento dos cristãos faz parte de um quadro mais amplo da intolerância e do radicalismo muçulmano que prevalece nos dias de hoje. Quando eu entrei nesse campo há 40 anos, não era assim. É um momento terrível e os cristãos, em especial, estão pagando um preço muito alto.
EMQ: Qual é o futuro do Islã nos Estados Unidos? E devíamos nos preocupar quando os muçulmanos falam sobre um califado islâmico global?
DP: O califado islâmico global é realmente um conceito poderoso e algo digno de preocupação. É difícil prever o futuro do Islã nos Estados Unidos. Há duas grandes possibilidades. Uma é se continuar no caminho radical e antagônico em relação à ordem existente ou (eu não vejo essa possibilidade na Europa) que o Islã se torne parte do cenário religioso americano e não tente dominá-lo. Existe essa possibilidade.
EMQ: Os líderes ocidentais, incluindo os americanos, realmente compreendem a raiz da militância islâmica? Eles continuam tentando separá-la da religião. Eles "entendem"?
DP: Basicamente, não. Eu diria que há três interpretações para o atual estado de coisas. Uma é o que eu chamo de visão das autoridades, a que o senhor acabou de descrever. As pessoas dizem, "o Islã foi sequestrado; o problema é o terrorismo; o Islã é uma religião de paz". É a negação do problema.
A segunda é o que eu chamo de visão de insurgência: "O Islã propriamente dito é o problema. O Islã sempre foi um problema, com a jihad, os assassinatos em nome da honra e coisas do gênero. O próprio Islã é perverso e problemático Os muçulmanos são inerentemente um problema". Eu acho que isso é abrangente demais e errado.
E por fim, há o meio termo, que eu apóio. Poder-se-ia resumir dizendo, "O Islã radical é o problema e o Islã moderado é a solução". Eu acredito na possibilidade do Islã evoluir de modo moderado, moderno e disposto a viver em paz com os outros. Acho possível que não muçulmanos e muçulmanos moderados trabalhem juntos para alcançar esse objetivo.
Inclusive, se o senhor acreditar na abordagem da insurgência, de que o próprio Islã é perverso, não há política que possa ser colocada em prática. O se pode fazer quando se é presidente [dos Estados Unidos] e no que acreditar? Jogar fora a liberdade de religião? Excluir os muçulmanos? Guerrear no exterior para fomentar o cristianismo? Nós não somos assim. Isso requereria mudanças que eu diria que simplesmente não seriam possíveis. De modo que se trata de um beco sem saída.
Ainda que se acreditasse nisso e eu tenho certeza de que alguns de nossos ouvintes acreditam, eu diria a vocês que se juntem a mim na maneira de ver o islamismo como uma ideologia política comparável ao fascismo e ao comunismo, visto que nós temos meios de derrotá-lo. Nós já vencemos guerras contra eles: na Segunda Guerra Mundial e na Guerra Fria. E podemos vencê-los novamente. Mas se virmos o problema como religião, não teremos os meios, não poderemos vencer.
EMQ: Há um temor de que se expressar contra o radicalismo islâmico irá provocar ataques a repórteres, autoridades ou quem quer que seja que expresse sua opinião? Sabemos que os convertidos do islamismo ao cristianismo estão sujeitos a fatwas. Existe o temor de que as pessoas serão atacadas caso usem a liberdade de expressão?
DP: Eu diferencio entre ataques físicos e ataques sócio-políticos, como ostracismo, condenação, perda do emprego e coisas do gênero. E eu diferencio aqueles dois da perseguição pelo governo. Houve casos extraordinários de caricaturistas anônimos no Reino Unido e na Holanda serem presos, rastreados pela polícia e presos, colocados na cadeia para passarem a noite devido às charges. Portanto há atualmente três dimensões distintas: a violenta, a sócio-política e a governamental.
Sim, esses são problemas significativos. Eu, na realidade, iniciei algo chamado Projeto Legal na minha organização, que está se concentrado exclusivamente em proteger os direitos de intelectuais, acadêmicos e ativistas de se expressarem livremente a respeito dessa gama de questões. Nós desenvolvemos uma especialidade. Temos uma rede de advogados que prestam serviços gratuitamente ou a custos reduzidos. Temos um bocado de dinheiro. E não apenas defendemos, em alguns casos, partimos para a ofensiva com o intuito de garantir que haja liberdade de expressão a respeito dessa questão tão importante, que é o Islã.
EMQ: E em qual dessas três o senhor se encaixa? E sei que o senhor é veementemente criticado por algumas organizações pró-islâmicas e por algumas das assim chamadas progressistas. Onde elas o colocam?
DP: Bem, não tenho sido ameaçado fisicamente e não sou perseguido pelo governo. Então para mim trata-se apenas do sócio-político.
EMQ: Se os muçulmanos estão preocupados que radicais estão se apossando da sua religião, por que o silêncio do Islã, de maneira geral, a respeito dessa questão?
DP: Não é um silencio total. Tem havido importantes exceções. Talvez a mais dramática tenha ocorrido em meados de 2007 quando literalmente milhões de pessoas que se concentravam nas ruas das cidades turcas disseram não à lei islâmica. E houve outras demonstrações importantes no Paquistão e em outros lugares. Mas eu concordo de maneira geral com o seu ponto de vista básico, que os muçulmanos que não querem que lhes seja imposta a lei islâmica e que não querem o califado, estejam quietos demais. Eu acho que isso tem a ver em parte com intimidação, em parte com falta de organização, com ideologia e com recursos financeiros.
Acredito que também haja respeito em relação a essas pessoas [islamistas radicais], de que estejam vivendo e aplicando o Islã em toda a sua dimensão. Só porque não há hoje resistência suficiente de muçulmanos moderados não significa que não haverá no futuro. Eu acredito que esse é um objetivo para o qual devemos trabalhar a fim de ajudarmos os muçulmanos moderados. O governo dos Estados Unidos e outras instituições públicas têm sido muito deficientes nessa área. Se o senhor olhar para a televisão ou for à universidade, verá de forma repetitiva que são os islamistas que aparecem.
Devemos excluí-los de maneira consciente e deixá-los de lado, excluí-los como faríamos com a ku-klux-klan ou com a Nação do Islã. Exclua-os da aparição pública e em seu lugar convide os moderados.
EMQ: No caso de algumas dessas organizações extremistas que o senhor mencionou, foram principalmente os cristãos que se rebelaram contra elas e as colocaram de lado. Espero que possamos ver o mesmo no futuro com os muçulmanos moderados.
DP: Eu também espero muito que seja assim.