NOVA DELHI – Embora já tenha passado um quarto de século desde que a Índia saiu do período de economia socialista e política externa pró-soviética, recentes conversas que mantive com intelectuais em Nova Delhi e em outros lugares, me fazem crer que especialistas em política externa nessa potencia emergente, basicamente ainda raciocinam via seu papel no mundo, principalmente em relação aos Estados Unidos, China e a região que eles chamam de Ásia Ocidental (ou seja, Oriente Médio).
O Primeiro Ministro da Índia Narenda Modi (centro) tirando uma selfie em agosto de 2015 juntamente com o Ministro do Ensino Superior e Pesquisa Científica dos Emirados Árabes Unidos Xeque Hamdan bin Mubarak Al Nahyan (esquerda) enquanto passeavam pela Grande Mesquita Xeque Zayed em Abu Dabi. |
Muito embora os dois primeiros países, com certeza, atraiam a maior atenção, o Oriente Médio apresenta importantes desafios para a Índia, além de uma pitada de oportunidades. A seguir apresento os principais elos dessa região volátil:
Islamismo: historicamente a influência islâmica quase sempre se deslocou partindo do Oriente Médio para outras regiões, incluindo o Sul da Ásia, quase nunca no sentido contrário. No momento é o que acontece com a doutrina islamista, a alegação segundo a qual para se tornarem ricos e poderosos os muçulmanos devem retornar a um modelo medieval e aplicar integralmente as leis islâmicas, que brada sua maior intensidade a partir da Arábia Saudita e do Irã tendo como alvo, respectivamente, muçulmanos sunitas e xiitas, em todo o mundo. A influência desses dois países radicaliza populações muçulmanas tradicionalmente moderadas nas mais diversas regiões (como os Bálcãs e a Indonésia), causando gravíssimas implicações para a Índia, cuja gigantesca comunidade muçulmana de 177 milhões de habitantes representa, de longe, a maior minoria religiosa do mundo. (A segunda é representada pelos 67 milhões de cristãos que residem na China).Agressão iraniana: dois fatores influenciam uma atitude indiana favorável em relação ao Irã e explicam os persistentes esforços que estimulam Nova Delhi a manter boas relações com Teerã: fortes vínculos históricos culturais e um estado paquistanês hostil situado entre os dois países. Muito bom, mas se o Irã não estiver sendo checado, e o governo indiano não estiver defendendo seus interesses e direitos, essa predisposição poderá se deteriorar em acomodação. O regime iraniano já fez uso da violência na Índia, sua belicosidade ameaça o fornecimento de petróleo do Golfo Pérsico do qual a Índia é dependente e sua sede em adquirir armas nucleares desestabiliza toda a região. Sob esta ótica, o fato de Nova Delhi ter assinado seu primeiríssimo acordo de defesa com o Qatar em 2008 e o segundo com a Arábia Saudita em 2014, dois países que antagonizam o Irã, é positivo enquanto aprofundar o investimento indiano na região portuária de Chabahar no Irã fato este que provavelmente tolherá a política indiana.
Agentes iranianos explodiram o automóvel de um diplomata israelense em Nova Delhi em fevereiro de 2013 ferindo duas pessoas. |
Provocar o Paquistão: o dinheiro de Riad banca a confrontação paquistanesa com a Índia de duas maneiras importantes: financiando massivamente as escolas islâmicas (madrassahs) que formam estudantes radicalizados, em abundância, que tendo memorizado o Alcorão sem terem se especializado em tecnologias modernas, servem de buchas de canhão para a jihad, além de ajudar a pagar, de forma generosa, a bomba nuclear "islâmica" que com seu propósito centrado exclusivamente na Índia ameaça o país desde 1998.
Comércio e expatriados: sendo o terceiro maior importador de petróleo bruto do mundo, a Índia tanto depende do Oriente Médio quanto o Oriente Médio depende da Índia para vendê-lo. O comércio de US$150 bilhões com apenas seis países do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC) totalizam cerca de um quinto do comércio anual da Índia, mesmo considerando que os indianos estão entre os maiores investidores diretos em bens imóveis no Golfo Pérsico. O número de trabalhadores indianos nos países do Golfo Pérsico é de aproximadamente 6,5 milhões sendo uma importante fonte de transferência de divisas para Índia (estimada em US$35 bilhões ao ano) e de influência wahhabista.
Aliança com Israel: o incremento nas relações com o estado judeu apresenta uma nota peculiarmente promissora. A população da Índia pode até ser 150 vezes maior do que a de Israel (1.300 milhões contra 8 milhões), mas os dois países dividem características importantes. No fundo os dois povos professam uma religião antiga, não adepta ao proselitismo. Ambos praticam a democracia e o secularismo, são aliados dos Estados Unidos e possuem armas nucleares. Ambos abrigam substanciais minorias muçulmanas (14% na Índia e 19% em Israel) cujas lealdades são duvidosas uma vez que os dois países enfrentam uma ameaça existencial em potencial de um estado muçulmano (Paquistão e Irã respectivamente). Fora essas generalidades, Israel e Índia dispõem de benefícios específicos que um pode oferecer ao outro: os dois países podem compartilhar questões de inteligência. Jerusalém pode ajudar no acesso a Washington, enquanto Nova Delhi pode ajudar no acesso ao que resta do movimento não alinhado. Nos segmentos em que Israel é líder mundial, como tecnologia da água, medicina, segurança e inovação de alta tecnologia, os indianos precisam daquilo que Israel tem para oferecer da mesma maneira que os israelenses precisam do vasto mercado indiano. Aliás, o governo da Índia está prestes a comprar US$3 bilhões em equipamentos militares israelenses, a maior venda já realizada por Israel.
O relacionamento, já importante, da Índia com o Oriente Médio está em franco desenvolvimento no que tange perigos e potencialidades. A questão que está tomando forma no horizonte é até que ponto os indianos têm condições de aproveitar os benefícios da Ásia Ocidental e ao mesmo tempo evitar o que é prejudicial. Dada a complexidade do nó, não será nada fácil.
O Sr. Pipes (DanielPipes.org, @DanielPipes) é o presidente do Middle East Forum. © 2016 por Daniel Pipes. Todos os direitos reservados.